Copacabana não é uma praia. Não só. Não só um bairro também. Copacabana é um enigma que acorda às cinco da manhã com o rangido das portas dos botecos sendo abertas, com o cheiro do café barato misturado ao som do mar batendo preguiçoso no calçadão. O céu ainda está indeciso entre o cinza e o dourado, e já tem gente com o pé na areia, como se o dia não pudesse começar sem esse toque de sal e vento.
A primeira coisa que chama atenção, antes mesmo da famosa calçada ondulada, é o movimento. Um vai e vem contínuo de gente, de histórias, de barulhos. Tudo junto, tudo misturado. Velhinhas saindo pra comprar pão, turistas olhando pra cima como se os prédios tivessem algo a dizer, surfistas com suas pranchas sob o braço, crianças chutando bola em qualquer espaço livre. E há sempre uma senhora com um vira-lata na coleira, caminhando com a dignidade de uma rainha.
Copacabana tem cheiro de maresia e de cachorro-quente. Tem gosto de água de coco num copo de plástico rachado. É aquele lugar onde você almoça num restaurante por quilo de esquina, ouvindo um senhor de boné contar pela milésima vez como viu o Tom Jobim passar ali. E ninguém discorda. Nem precisa.Aqui, todas as versões da história têm espaço.
Os prédios antigos, com suas varandas enferrujadas e cortinas puídas, parecem guardar segredos. Há uma melancolia nos azulejos desbotados, como se cada apartamento fosse um microcosmo de um Brasil que não sabe se vai ou se volta. Em um andar mora um diplomata aposentado. No de cima, uma argentina que dá aula de tango. E ali ao lado, um estudante de teatro que faz bico de garçom num bar da Siqueira Campos.
A praia, claro, é o centro gravitacional. Não importa o dia da semana: ela atrai corpos e almas. Gente que corre, que se bronzeia, que reza, que canta, que dorme ao som do mar. Ambulantes oferecem de tudo: mate gelado, canga, biscoito Globo, livro usado, escapulário. E há sempre um gringo surpreso tentando entender por que tem tanta vida numa só faixa de areia.
À noite, a Copacabana muda de roupa mas não de espírito. Ela não se apaga. Os postes iluminam a orla com um amarelo meio nostálgico, e os bares ganham vozes, risos, encontros. Músicos tocam sem amplificador, casais se beijam sem pressa, solitários observam sem culpa. E há sempre um flanelinha disposto a guardar o carro por uns trocados, com um sorriso maroto e uma história pronta, só esperando um ouvido disposto.
Copacabana é bonita, , mas não da beleza arrumada de catálogo de turismo. É uma beleza imperfeita, real. Uma beleza de gente. Gente que briga no mercado, que se ajuda na fila do banco, que xinga o calor e agradece o sol. Gente que não sai dali por nada, mesmo quando o aluguel sobe, mesmo quando a cidade aperta.
Copacabana é o último respiro antes do caos do centro, é o intervalo entre o sonho e a sobrevivência. É o lugar onde o tempo tem outro ritmo, onde o ontem convive com o hoje sem cerimônia. Quem vive aqui entende: Copacabana não se explica. Se sente. Se vive. E, quando se vai embora, ela continua dentro da gente, feito areia no sapato, incômoda, persistente e, de algum jeito estranho, reconfortante.
Tá bom, morar em Copa também tem seu lado ruim. O maior é o serviço, que por estar no Rio de Janeiro, é um dos piores possíveis. Se você é do sul do Brasil ou de São Paulo, prepare-se para esperar horas em filas, ser atendido mal, perguntar uma coisa para uma pessoa na rua e ela não responder, e qualquer pergunta que você fizer para alguém, espere ser xingado. É assim que cariocas vivem, e sentem orgulho disso.